11 de dezembro de 2007

O paradoxo da memória da Internet

Meu último post, feito já faz alguns dias, foi sobre o tempo. A memória da Internet às vezes me assusta. É possível que daqui a alguns anos, eu venha a me deparar com as coisas que eu escrevo hoje. O que eu vou achar delas no futuro? Será que vão fazer sentido? Será que os artigos que hoje me parecem inofensivos vão ter algum impacto daqui a algum tempo? Será que eles vão me abrir as portas para um novo emprego, ou vão ser o oposto - o motivo para que eu não seja contratado por uma empresa, por conta de uma opinião que foi expressada vários anos antes?

Paradoxalmente, o contrário também é verdade. Não existe uma política de memória consistente na Web. Algumas coisas serão preservadas, outras serão apagadas sem aviso prévio. Recentemente, a morte de um blogger influente (Marc Orchant, que escrevia para a ZDNet e mais recentemente para a BlogNation) levantou essa questão. O David Winer (um dos principais "fundadores" da Web 2.0, criador do RSS e do XML-RPC, entre outros) comenta sobre isso: precisamos de arquivos à prova de futuro, para que as obras de nossa época não desapareçam quando as pessoas que cuidam delas hoje deixarem de fazê-lo.

Essa aparente "falta de critério" é consequência do próprio desenho da Internet. A rede não tem donos, e não tem política única. É um mercado aberto. Ninguém se preocupa se a informação que está na Internet vai ser preservada para o futuro ou não. E da mesma forma, ninguém se preocupa se alguma informação pode inadvertidamente vazar e ficar permanentemente na memória... quando isso seria indesejável.

Esse é o paradoxo da memória da Internet. Eterna, mas também relapsa.

E você? Gostaria de ser lembrado na Internet, ou gostaria que a rede esquecesse de você um pouco?

20 de novembro de 2007

20 anos passam rápido

Fui me apresentar em um curso ontem, e o instrutor perguntou: "quantos anos de TI você tem?". Respondi, "23". É muito tempo.

Tenho ainda perdidos em casa coisas antigas. Até uns quatro anos atrás eu tenho certeza que tinha um HD de 5 MB em algum lugar. Isso mesmo - 5 MB. Pesava uns dois quilos. Juro. Tem floppies de 3"1/2. Os mais antigos, de 5"1/4 sumiram faz tempo. Costumo guardar os HDs de PCs antigos - cada vez que troco, guardo, pra recuperar alguma coisa se precisar (e isso já me salvou algumas vezes). Perdidos por aqui tem arquivos zipados dos anos 90 e começo dos anos 2000. Código fonte em Pascal, arquivos .DOC em Word para DOS. Se bobear tem arquivos Wordstar em algum lugar.

Antigamente, a forma de armazenar tudo era assim. Disquetes, HDs, backups em fita. Com o tempo, o backup se perde - jogado fora, ou não funciona mais. Ou seja, muita história se perde. Mas hoje em dia tudo mudou...

Aos poucos, vou migrando meus bookmarks para o Delicious. Mantenho alguns blogs, onde textos que iriam parar em um floppy poeirento 20 anos atrás continuarão vivos... daqui a 20 anos.

Já imaginou pesquisar sobre você mesmo na Internet daqui a vinte anos, e achar um texto que você escreveu hoje?

Já imaginou pesquisar seus bookmarks e achar um link para uma página que você viu em 2001?

À medida que migramos nossa memória coletiva para a Internet, nossa percepção do tempo muda. É como um elefante que nunca esquece. Temos tempo para nos acostumar devagar, mas mesmo assim não deixa de ser estranho. É como ver o Leo Jaime cantando agora, 20 e tantos anos depois. Gordo, irreconhecível, mas é o Leo Jaime. Como é que a gente mesmo vai se ver daqui a 20 anos, quando tiver muito mais do que as fotos empoeiradas para lembrar como éramos?

Comentários são bem vindos, até 2027.

2 de novembro de 2007

Jornalismo 2.0

Desde que a Web começou a ganhar importância, se fala que os jornais tradicionais vão acabar. Agora, na era do YouTube, não é só o jornalismo impresso que está ameaçado. Estamos vivendo o fim de uma era. O jornalismo 2.0 está nascendo agora, debaixo do nariz da Globo e de outros gigantes da mídia.

O jornalismo tradicional é um exemplo clássico da cultura da escassez. Tanto o espaço do jornal como o tempo do leitor são limitados. Por isso, o critério de seleção de material é a fundação de um jornal. A solução tradicional é um modelo hierárquico rígido. O editor-chefe dá o tom do jornal; monta a pauta, define quais notícias são dignas de serem publicadas, onde serão publicadas, quanto espaço (ou tempo) cada uma terá, etc. O modelo também é marcado pelo corporativismo: a premissa de que somente um jornalista formado possa escrever ou selecionar notícias não se sustenta, bastando ver quantos dos melhores jornalistas do mundo jamais estudaram jornalismo, sendo formados em outras áreas.

A Web atual é a antítese da escassez. Qualquer um pode ser editor, selecionando e filtrando material encontrado através um site de busca ou seguindo as dicas repassadas pelos amigos. Qualquer um pode ser um jornalista. Nesta semana Twitter foi o primeiro veículo a ter informações quentes sobre o terremoto em San Jose. O Twitter é um site social que mescla Web e SMS, sendo uma plataforma excepcional para propagação instantânea de informações - toda ela gerada pelos próprios usuários.

A reação da mídia tradicional varia. Acho que alguns estão no caminho certo. A Reuters investiu no BlogBurst, que distribui conteúdo de blogs para a mídia tradicional. A mesma empresa também aceita submissão de fotos jornalísticas tiradas por amadores diretamente no site. O diferencial dessa abordagem é simples - o reconhecimento de que o conteúdo gerado pelos próprios leitores tem valor e supera em qualidade e novidade o conteúdo gerado dentro do modelo tradicional.

Já outras empresas parecem não ter entendido ainda o que está ocorrendo. A reação da imprensa belga ao Google News, por exemplo - cortando a própria fonte de acessos em vez de se aliar. Outros ainda tentam proteger seu conteúdo assinando acordos exclusivos com sites populares como o YouTube ou o Facebook. Grandes grupos, como a Fox e mesmo a rede Globo, investem pesadamente - mas a tentativa tem mais um "cheiro" de tentar manter o modelo atual do que de se adaptar aos novos tempos. Pode até parecer que funciona agora... mas a longo prazo, não vai funcionar.

P.S. O recente escândalo do leite mostra a força que a mídia tradicional tem no Brasil. Ou seja, ainda é cedo. Mas como toda revolução, muitas vezes a mudança só é perrcebida quando é tarde demais.

13 de outubro de 2007

Novidades em vídeo na Web - agora com legendas!

Sinto falta de uma feature no YouTube: legendas. Há vídeos interessantes, mas em inglês e sem legendas. Não dá para compartilhar com todo mundo. Adicionar as legendas ao filme é um processo complicado: é preciso baixar o filme, editar o filme sobrepondo as legendas, e colocar o filme de novo no YouTube. Como o YouTube não permite baixar os filmes no formato original, é necessário usar algum dos "hacks" existentes para essa finalidade. A qualidade do filme é ruim e fica pior ainda com a legenda aplicada. Com vídeo bem "paradinho" até que funciona, mas dependendo da velocidade do vídeo a legenda fica ilegível.

Porque o YouTube não permite aplicar as legendas, em formato texto, diretamente sobre o vídeo que está sendo tocado? É tão complicado assim?

Parece que não. Achei hoje (via Scoble) um novo serviço de vídeo legendado. O dotSub permite aplicar as legendas diretamente no vídeo, permitindo selecionar até 100 idiomas para o mesmo vídeo. Os usuários registrados podem participar do processo, submetendo novas legendas para os vídeos postados. O site não tem ainda nem de perto o volume do YouTube, mas a qualidade é boa. Talvez devido à sua proposta, achei algumas boas revistas eletrônicas, como o Common Craft Show, que tem vídeos interessante como este que explica o que são as redes sociais:



Outro site interesante que está experimentando com os recursos do dotSub é o Pop!Tech. É um evento visionário na mesma linha do TED, com palestras de pessoas que estão fazendo coisas para "mudar o mundo". Algumas palestras do Pop!Tech já tem legendas, inclusive em português, como a palestra do Chris Anderson, editor da Wired, sobre uma idéia revolucionário: a nova economia da abundância:



Agora que um concorrente já tem essa funcionalidade, resta aguardar para que o líder do setor, o YouTube, se mexa. Quem sabe eles dão um passo adiante e suportam não somente legendas... mas também trilhas de áudio diferenciadas, com dublagem? Se tudo isso puder ser feito de forma colaborativa, melhor ainda. Afinal, a Web 2.0 somos nós:

12 de outubro de 2007

Web multimídia - uma questão de tempo

A Web multimídia está chegando. Para que ela se dissemine, é uma questão de tempo, no sentido mais amplo da palavra.

Lidar com uma quantidade de informação cada vez maior é um grande desafio. Nossa capacidade de consumir informação é limitada. Existem técnicas diversas para acelerar a leitura, ou para gerenciar melhor as atividades, descartando rapidamente o que for irrelevante. Porém existe um limite, que é o tempo. Podemos fazer melhor uso do tempo, mas não podemos criar mais horas de trabalho. É a vida.

A questão do tempo se torna ainda mais evidente com a transição da web escrita para a web multimídia. Apesar da má vontade de muita gente (talvez da maioria), a leitura ainda é o meio mais eficaz de consumir informação. A leitura tem uma grande vantagem - ela não é limitada pelo tempo, da mesma forma que um vídeo ou um podcast são. É possível passar os olhos rapidamente sobre um texto e ter uma idéia do que está escrito. Isso não funciona tão bem com um documentário. Por isso o tempo vai se tornar ainda mais importante do que é hoje.

Estamos vivendo o nascimento da Web multimídia. Já é possível desligar a TV e consumir notícias e trocar idéias somente com vídeos distribuídos pela Internet. Se você ainda não tentou, experimente. A qualidade ainda é variável, mas a possibilidade de obter perspectivas diferentes compensa. Existem vídeos excelentes que você nunca teria oportunidade de assistir, se não fosse o YouTube. Você também vai ver que a Web multimídia é democrática, e nivela os consumidores. O limite não é a velocidade de leitura, porque o tempo para assistir um vídeo é igual para todos. É nesse ponto em que surge um problema.

A maioria dos vídeos amadores postados no YouTube tem menos de dez minutos. Muitos tem menos de cinco minutos, e uma grande quantidade de clips dura apenas uns poucos segundos. Porém, à medida que a produção se profissionaliza, parece que surge uma tentação irrefreável de publicar mais material. É a síndrome da entrevista não editada. São vídeos de uma hora ou mais de duração, cheios de pausas para respirar, tiradinhas do entrevistador, interjeições (os "ahã" pontuando a conversa), etc. Se você estuda e/ou trabalha, é claramente impossível assistir mais do que um ou dois vídeos desses por dia. Não vale a pena.

Porque esses vídeos são tão longos? É simples: editar vídeos não é fácil. Primeiro, porque consome muito tempo por parte do editor. E segundo, porque cortar material "dói". É só olhar para sua própria coleção de fotos digitais que você vai entender o que eu estou dizendo (quantos arquivos você deveria ter deletado da coleção e não teve coragem de apagar?). Superar esses pontos é fundamental para alavancar o potencial da Web multimídia da melhor forma possível.

Se você pretende entrar na Web multimídia produzindo seus vídeos, lembre-se disso: um bom editor tem um controle mágico do tempo, que se multiplica pela audiência. Um vídeo gravado em uma hora assistido por dez pessoas, consome onze horas no total. Invista três horas do seu tempo reduzindo o vídeo para 15 minutos (mantendo o tema central intacto); o tempo total cai para cinco horas e meia. Metade do tempo. Você pode até argumentar que o tempo poupado não é seu. Esteja certo que esse tempo eventualmente voltará para você, seja porque as suas conversas serão mais pontuais; ou porque você atingirá um público maior; ou porque vai sobrar tempo para as outras pessoas produzirem material bem produzido e curto, que não vai tomar tanto o seu tempo. Lembre-se: o tempo é precioso.

7 de outubro de 2007

Work 2.0, ou como a Web vai mudar o ambiente de trabalho para sempre

Vamos falar de Web 2.0 - oops, Work 2.0, ou ainda, Office 2.0. Um grande quebra-cabeça está sendo montado: como transformar as "ferramentas de produtividade" atuais, incorporando a comunicação online? As peças começam a se encaixar. São muitas, o que torna as coisas meio confusas. Às vezes ainda se parecem experimentos juvenis ou brinquedos divertidos, mas quando combinados, tem um potencial fabuloso. Vai revolucionar a forma como trabalhamos.

Um exemplo: visto isoladamente, o Google Apps não parece assim tão interessante. Os dados ficam no servidor do Google e não no seu micro. Os recursos são relativamente limitados se comparados ao Office. A velocidade também deixa a desejar. Parece mais fácil e mais rápido editar textos, planilhas e apresentações no seu micro, usando o MS Office. Certo?

Errado. O problema é que estamos tão acostumados a pensar em termos de arquivos que esquecemos de pensar em termos de processos. Arquivos, documentos, diretórios. Em pleno Windows Vista, ainda estamos presos ao paradigma do CP/M (para os que tem menos de 40, o precursor do DOS e portanto, de toda família de sistemas operacionais da Microsoft). Esse problema contamina a própria forma como usamos os computadores no ambiente de trabalho.

A idéia do Microsoft Office não é muito diferente da idéia de uma máquina de escrever eletrônica. Você recebe uma tarefa, trabalha nela no seu micro, e repassa o resultado para outro. Eletronicamente, ficou fácil copiar o resultado. Porém isso sempre deixa um rastro de versões antigas, trabalho duplicado, e informação inconsistente. Falta contexto. Os documentos existem isoladamente fora do processo no qual foram criados. Essa informação se perde e torna impossível recuperar o processo em qualquer ponto do passado.

A "solução" para o problema foi usar o email. É a solução errada para o problema errado. Email é ferramenta de comunicação pessoal. Por falta de algo melhor, se tornou a ferramenta para comunicação corporativa. E os processos sofrem com isso.

Com a Web 2.0, tudo muda. Não se fala mais em arquivos. Por incrível que pareça, nem se fala em URLs. O ponto essencial é a capacidade de combinar elementos dinamicamente. E aí, se torna possível pensar em processos, ou em fluxo de informação. Esse fenômeno está acontecendo agora, de forma totalmente modular. Não dependemos mais da Microsoft e do seu ciclo cada vez mais lento de desenvolvimento. Na Web 2.0, ainda não há controle centralizado, o que torna a inovação possível. Nos EUA, é cada vez mais barato criar uma startup, e milhares de idéias estão sendo experimentadas ao mesmo tempo. É uma profusão de criatividade como poucas vezes se viu.

Um ambiente de "Work 2.0" permitirá integrar melhor todos os membros de uma equipe de forma transparente. Permitirá que a informação seja armazenada com todos os seus "links", com o contexto preservado. Permitirá que a interação com o cliente seja armazenada como parte do próprio processo. Libertará as conversações da "ditadura da caixa de correio", permitindo que outras pessoas possam entender como as coisas foram feitas e assumir a atividade dali por diante.

Muito disso já pode ser feito hoje, mas ainda exige um bocado de paciênca e muita coragem. Porém os tempos mudam rápido, e em poucos anos, nosso ambiente de trabalho será radicalmente do que vivemos hoje. Ainda está cedo, mas o impacto não se restringe aos computadores e sistemas - deve mudar a forma como as empresas funcionam. São tempos excitantes logo à frente.

25 de setembro de 2007

Web 2.0, o brasileiro e o anonimato

Algumas conexões são curiosas.

Semana passada, recebi dois comentários aqui no blog a respeito da concentração do mercado de TI no Brasil. Ambos postaram como anônimos, comentando sobre o processo de centralização da Oi no RJ. Tirando de lado os comentários em si, que são importantes, acho curioso que as pessoas se preocupem tanto com o seu anonimato na hora de postar uma opinião. É um comportamento tipicamente brasileiro.

Há um mês atrás, estive em um evento excelente do Gartner em SP. Um dos temas (entre muitos) foi a colaboração e a Web 2.0 como ferramenta de negócios. Conversei com o palestrante (Waldir Arevolo, um dos poucos brasileiros que trabalha como analista do Gartner) e perguntei a ele porque o brasileiro colabora tão pouco quando ferramentas como blogs e Wikis são usadas no ambiente de trabalho. Acho que a pergunta o pegou de surpresa. Ele sugeriu algumas estratégias interessantes para encorajar as pessoas a participarem. Porém, a pergunta ficou no ar.

O brasileiro tem uma cultura curiosa. Ele adora aparecer, quando o assunto é inofensivo. Basta ver a forma como adotamos o MSN para conversar trivialidades. Por outro lado, o brasileiro detesta assumir posições políticas em público. No Orkut, criamos personalidades de fachada para escrever o que dá na cabeça, e para entrar nas comunidades que nos interessam. Pode ser medo de se comprometer, ou pode ser um resquício de uma cultura de perseguição cultivada em uma história política conturbada. Pode ser por um motivo ainda mais simples - pouca gente sabe escrever no Brasil. Ou pode ser porque as pessoas que escrevem sério são tachadas como chatas, e todo mundo quer ser popular.

No Brasil, é popular escrever errado. É popular contar piadas. Mas não é popular emitir qualquer opinião por escrito, contra ou a favor, mesmo que seja para falar mal do governo. Esse é o domínio dos colunistas e dos jornalistas. No Brasil, é popular aplaudir, ou até ironizar. Mas não é popular polemizar.

Em uma reunião recente discutindo estratégias de marketing, falamos sobre uso de ferramentas Web 2.0 no mercado corporativo. A primeira preocupação foi com o alinhamento do discurso, e definir quem pode escrever em nome da empresa. É mais uma preocupação em que nós brasileiros somos mais conservadores do que nossos primos do norte. Obviamente que devem haver regras e limites, em nome da imagem corporativa. Mas será que é necessário tanto cuidado? Será que temos tanto a perder assim? Será que não nos levamos excessivamente a sério?

Como quebrar essa cultura? Como encorajar as pessoas a participarem mais de um processo de debate aberto? Talvez as novas gerações, que já nasceram sob o signo da Web 2.0, possam usar melhor essas ferramentas maravilhosas. Mas sinto que muita coisa nesse país poderia melhorar se as pessoas deixassem um pouco mais o seu anonimato e assumissem publicamente suas opiniões. Temos muito mais a ganhar do que temos a perder. Esse é o ponto.

16 de setembro de 2007

Interação social e tecnologia: ThePalace, Second Life e Facebook

Respondi hoje a um post no blog do Eduardo Rabboni, falando sobre o Second Life no Brasil. Achei que a resposta merecia considerações mais extensas aqui nos Rascunhos Rotos. Antes de mais nada, que fique clara uma coisa: acho que o "fenômeno" Second Life é uma bolha passageira, e como praticamente tudo na Internet, vai dar lugar a algo melhor. O ambiente não é propício para uma evolução gradual, o que o torna um candidato à longa lista de sucessos do passado.
Em 1994/1995, eu tinha um pequeno provedor Internet em BH. Chat era com IRC - não existia MSN e nem mesmo ICQ (só surgiu em 1996). Na época, surgiu o The Palace. Não era um programa qualquer, era um experimento financiado pela Time Warner. Era um chat gráfico em 2D com múltiplas salas em um ambiente virtual. O usuário navegava pelas salas usando seu avatar (está achando o termo familiar?). Para os padrões de 2007 o visual era rudimentar, mas servia para que o o usuário se expressasse. O texto aparecia na forma de balões [1]:

O Palace fez sucesso na época mas não decolou. A tecnologia não estava madura; não existia banda larga, o acesso era discado. Os PCs da época não tinham CPU suficiente para oferecer gráficos de alta qualidade.

Hoje, 13 anos depois vemos o Second Life, oferecendo um ambiente virtual interativo. A tecnologia agora é melhor, mas será que é o suficiente?

Acredito que não. Acho que a maioria das pessoas se sente tentada a imaginar o futuro em uma interface visual como a do Second Life, um mundo virtual onde se pode interagir com as pessoas através de um personagem. Mas acho que na prática, esse tipo de interface ainda precisa evoluir muito para ser prática e confortável.

Enquanto isso, a grande aplicação do momento na Internet não é o Second Life, mas sim o Facebook. O Facebook é mais do que "um Orkut que deu certo" (nota: o Orkut é tido como um fracasso retumbante nos EUA). O Facebook é uma plataforma extensível, que facilita o processo de publicação e consumo de informação de várias formas, dentro das redes sociais. Ele não tenta imitar o mundo físico como o Second Life, mas imita a forma como nós, seres humanos, lidamos com nossas relações pessoais. E esse é o ponto mais importante.

Nós, seres humanos, somos consumidores e produtores ávidos de informação. Nosso cérebro evoluiu para sobreviver em um mundo onde o relacionamento humano é fundamental. Sabemos, de forma inata, como ler linguagem corporal, como determinar sentimentos e emoções atrás de qualquer tipo de comunicação. Ferramentas como o Facebook são bem sucedidas porque integram e alimentam a nossa rede de relacionamento social. Já o Second Life imita outro aspecto da vida - a experiência física - que nem de perto é tão importante quanto a rede de relacionamento de cada um de nós. Por isso acho que serviços como o Facebook apontam para o futuro de forma mais precisa do que o Second Life. Em outras palavras, a realidade mental - social e psicológica - é mais importante do que a realidade física. Afinal, é ela que nos faz humanos.


[1] imagem retirada do artigo Etnografia em ambientes de sociabilidade virtual multimídia. - Mário Guimarães Jr., 1998

9 de setembro de 2007

A era de ouro da Web está só começando

Meados dos anos 90. A Internet começa a se abrir ao acesso comercial. O email é o "killer app" da rede. No CERN, Tim Berners Lee introduz a World Wide Web. Em poucos anos, a Web supera o email e transforma a Internet em um fenômeno mundial.

2007. A "Web 2.0" é um grande avanço frente à Web dos anos 90. O surgimento de interfaces ricas, usando tecnologias como Ajax, é só o começo. Aplicações sociais disparam em popularidade. Orkut, LinkedIn, Facebook, MySpace...

Até onde a Web vai nos levar?

Em 2003, em plena crise do estouro da bolha, muitos comparavam a Internet com a corrida do ouro: quem chegou primeiro ficou rico, quem chegou tarde perdeu tudo. Nessa época, Jeff Bezos (da Amazon) observou que a Internet era mais do que isso, e que a fase da inovação estava só começando. Na corrida do ouro, a hora que a mina se esgota, não sobra nada para quem vem depois. A Internet não é assim. A infraestrutura que foi criada no auge da bolha continuava lá, disponível, para que outros criem coisas novas.

Bezos comparou a atual fase da Internet com outro estouro tecnológico: o surgimento dos primeiros aparelhos elétricos domésticos. Aproveitando a fiação que havia sido feita para a iluminação, empresas começaram a criar novos produtos para ajudar nos afazeres da casa. Assim surgiram coisas como a torradeira, o aspirador de pó e a máquina de secar sapatos. Nem todos foram bem sucedidos. Muita gente quebrou, mas outros acertaram a mão com produtos inovadores, que hoje fazem parte do nosso dia a dia.

Há um ponto em comum entre a Web e os primeiros aparelhos elétricos: ambos são (ou eram) rudimentares. Os primeiros aparelhos não tinham tomada, e eram ligados no lugar do bulbo da lâmpada (afinal, as tomadas não existiam nessa época). Não existia chave liga-desliga - para desligar tinha que ir no bulbo e desrosquear. Obviamente, muita gente se acidentava.

Por mais que a gente se entusiasme com a tecnologia, a Web ainda é assim, rudimentar. Falta muito para que ela se torne parte do nosso dia a dia como as torradeiras ou máquinas de lavar roupa. Enquanto isso, muita gente inova, e muita gente experimenta, com pequenos acidentes aqui ou ali. Mas é assim que se faz o progresso.

7 de setembro de 2007

Esbarrões: Palm, HDs, Windows Vista, Google, Apple, contratação de pessoas.

Ao longo da semana, esbarrei em um bocado de coisa e achei melhor blogar tudo de uma vez.

Esbarrei na Palm Computing duas vezes essa semana. A primeira, quando escrevi um comentário sobre a história da Palm. Agora, a notícia de que o futuro da Palm não parece promissor. Algumas empresas tem o toque de Midas - tudo que elas fazem dá certo. A Palm já foi líder incontestável de mercado. Com erros de marketing, de desenvolvimento de produto, falta de um ecosistema de parceiros, a morte lenta parece ser inevitável.

Vi notícias sobre HDs mistos (com disco rígido e memória Flash) (via Scoble e Dvorak). São mais rápidos que os HDs convencionais - dá pra carregar o OS sem precisar girar os discos. A Microsoft tinha prometido suporte a esses novos HDs no Vista mas não cumpriu o prometido...

Falando em Windows Vista, as notícias são desencontradas. A Microsoft comemora publicamente vendas recordes. Porém, o mercado não tem reagido bem. Fabricantes desancam a empresa publicamente. A Dell passou a dar opção pelo Linux, a Acer reclama que o Vista não estimula as pessoas a comprar um PC novo. Se por um lado a Microsoft deu um salto de qualidade em termos de estabilidade e de segurança, parece que deixa a desejar no básico, que é o produto.

Outro encontrão foi com a Apple, que teve uma semana cheia. De um lado, produtos novos (iPod Touch), e a redução de preços do iPhone. De outro a reclamação dos usuários contra a plataforma fechada, e o choque de quem descobriu que pagou mais caro "à toa". A Apple já teve problemas sérios com isso... e o Steve Jobs foi demitido. Agora, ele é o rei de novo. Estaria cometendo os mesmos erros? Bom, dessa vez ele veio a público com uma carta explicando a redução de preços do iPod. Ponto pra ele, está ouvindo os clientes. Falta abrir as plataformas da Apple.

Falando em Jobs, recebi um link do Danilo Gontijo (agora na Oracle) de uma palestra famosa que eu ainda não tinha visto: o discurso de formatura de Stanford em 2005 (legendado). Tem cópia no YouTube também, um pouco mais legível só que dividido em duas partes. Grande fala motivacional (aliás, devo passar para minha equipe na CPD na semana que vem).

Fechando os esbarrões, tenho estudado muito sobre contratação de pessoas. Contratar gente boa é difícil, e o processo usual não ajuda. O Seth Godin propõe uma pergunta: afinal o que estamos contratando? O processo normal de entrevista tende a selecionar não o melhor candidato para a sua vaga... mas a pessoa que se dá melhor com o processo. Muita gente boa não vai adiante porque não se veste bem, não sabe escrever um currículo, ou porque simplesmente não acredita em si mesma - o que pode não ter nada a ver com a competência da pessoa. Pior: muitas vezes, a pessoa que cuida da seleção se preocupa mais em fechar o processo (contratar "alguém") do que em contratar a melhor pessoa, ou em fazer uma proposta irrecusável. O comentário do Joel Spolsky sobre contratação vai na mesma linha (nota: esse podcast é longo, mas é bastante interessante).

Semana cheia... agora, é feriado, 7 de setembro, e é hora de descansar. Semana que vem tem mais.

1 de setembro de 2007

Convergência - ou Jobs, Gates, e o mundo móvel

Viajei longe agora.

Estava lendo um post da Bia Kunze que falava, entre outras coisas, sobre convergência - usar um só dispositivo como smartphone e como mp3 player. Ela se mostra surpreendida por ter abandonado aos poucos o seu iPod Nano em favor do seu telefone novo HTC Touch. Para mim é uma surpresa também. Vejamos:

  • Cada dispositivo tem suas próprias exigências ergonômicas. Acho complicado fazer um telefone, uma câmera digital e um MP3 player no mesmo formato. Acho que alguma coisa acaba sacrificada em termos de usabilidade.
  • A bateria é um ponto fundamental, e pelo que a Bia comenta, é o ponto forte do HTC Touch.
  • Finalmente, tem o problema da integração de software, e é aí que a viagem começa.
A viagem começa pouco mais de dez anos atrás, quando surgiu o primeiro "handheld" de verdade, o Palm Pilot. Foi o divisor de águas na indústria de portáteis - era prático, usava pilhas comuns, e tinha um software extremamente simples, que... funcionava. A Apple já tinha tentado entrar nesse mercado antes, com um produto visionário, o Newton, que simplesmente não colou. O produto era caro, grande demais, e tinha um software instável.

A Apple quase quebrou por conta dos fracassos da época, Newton incluído. Uma década depois, o iTunes e o iPod formam a dupla que catapultou a Apple de volta para o topo do mercado. Onde foi que a Apple acertou?

Na integração do software.

(ok, o design é fantástico, mas isso não adianta nada se o produto não for fácil de usar)

Ao tornar simples o processo de gerenciar a biblioteca de músicas, a dupla iPod e iTunes se tornou um sucesso. É a diferença entre copiar arquivos em um pen drive, ou comprar música por $0.99 com um clique e sair ouvindo. Gente normal consegue usar.

O que está acontecendo agora, e qual é a viagem então?

A Microsoft parece que finalmente está chegando lá. A Bia comenta que o a edição móvel do Windows Media Player já é suficiente prática para substituir a dupla da Apple no seu dia a dia. Eu sinceramente achei que isso ia demorar pra acontecer. A vantagem que a turma de Jobs & cia limitada tem nesse novo mercado é fantástica, mas aos poucos, parece que a Microsoft vai reduzindo essa distância.

A Apple sempre se caracterizou por produtos extremamente bem concebidos, altamente integrados - verdadeiros sonhos de consumo. Porém, com exceção do Apple II - que era completamente aberto - todos os seus outros produtos são fechados. Sua estratégia é baseada no controle rigoroso sobre o desenvolvimento do produto, sem abertura para ofertas de terceiros.

Já a Microsoft, apesar de ser uma defensora ferrenha de sistemas proprietários e APIs fechadas, sabe jogar com sistemas abertos quando isso lhe convém. Sua estratégia de licenciamento é mais flexível. Essa forma de jogar foi determinante para que ela alcançasse a posição invejável que tem hoje. Se ela igualar a Apple no terreno onde esta é mais forte, acredito que seja questão de tempo para que a Microsoft tome o mercado.

Vem daí minha viagem de hoje. Já imaginaram o que aconteceria se a Apple tivesse como sócio o Sr. Bill Gates? Imaginem se ela pudesse aliar sua fantástica capacidade de desenvolvimento, sua visão de integração, com um pouco mais de pragmatismo e uma visão mais ampla do mercado. Onde essa combinação iria nos levar?


31 de agosto de 2007

O problema da concentração de TI em SP (e RJ)

Tem um tema que me incomoda faz tempo, que é a excessiva centralização do Brasil em torno de São Paulo, e em menor escala, do Rio de Janeiro. Para quem trabalha no setor de tecnologia, essa concentração é preocupante. É ruim para todo mundo:

  • as empresas localizadas em São Paulo reclamam dos custos altos e da carência de mão de obra;
  • os profissionais de tecnologia reclamam que não há opção fora de São Paulo. Alguns vão e entopem ainda mais a cidade, e mesmo assim, não conseguem suprir toda demanda. Outros ficam e não conseguem se desenvolver, por falta de opção profissional.
  • as empresas que ficam fora de São Paulo tem seu crescimento limitado, pois o mercado é restrito.
O curioso nisso tudo é que o mercado global vive uma fase de crescimento acelerado. Há grandes oportunidades de 'outsourcing'. O Brasil tem uma posição forte nesse mercado e poderia crescer ainda mais, porém, para isso precisa equacionar melhor uma série de coisas. Acredito que a questão da concentração em São Paulo é uma delas. Vejamos alguns pontos:
  • Existem várias cidades no Brasil com índices de educação e qualidade de vida que podem sediar empresas fortes no segmento de TI, como é o caso de Belo Horizonte, Curitiba, Porto Alegre, Salvador e Recife.
  • A infra-estrutura de telecomunicações já possui capacidade suficiente para suportar aplicações de colaboração, incluindo videoconferência e outras tecnologias de comunicação e cooperação em tempo real.
  • Atividades importantes, como hospedagem de datacenters, desenvolvimento de software e suporte podem ser feitas remotamente, usando os meios de comunicação citados.
Tenho a percepção de que em outros países, a concentração tende a ser menor do que no Brasil. Nos EUA, existem muitas empresas de software e TI sediadas na Califórnia, mas estão espalhadas por uma área relativamente grande se comparado com a cidade de São Paulo; isso tem impacto na qualidade de vida. Além disso, grandes empresas ficam fora dessa área, como é o caso da Microsoft, que fica no Estado de Washington, bem mais ao norte; e boa parte da pesquisa é feita na costa leste, em Massachussets. Outros segmentos são ainda menos concentrados - a indústria de chips tem presença forte no meio-oeste, e a indústria de telecomunicações tem presença na região de Boston e na Flórida.

A concentração traz um grande problema porque perpetua uma situação ruim. As pessoas vão para São Paulo porque só tem emprego lá; o mercado das outras regiões não se desenvolve; e a qualidade de vida em São Paulo só faz cair. A cidade está a ponto de um colapso urbano. A única forma de crescer, agora, é descentralizando, descarregando as operações em outros locais, de forma a criar um crescimento sustentado com uma base muito maior.

Porque as coisas no Brasil são assim? Um dos motivos é que nós gostamos de fazer negócio "olho no olho". Outro motivo é que nossa infraestrutura de transporte é historicamente deficiente, e as pessoas preferem não ter que viajar muito - perde-se muito tempo, custa caro, não é seguro, etc. Porém, se quisermos aproveitar o crescimento do mercado mundial, é importante que sejamos capazes de superar essa barreira.

Como superar esse problema? Essa é a parte mais complicada. As empresas de fora de São Paulo não conseguem ainda penetrar no mercado de lá. Apesar de reclamar da falta de mão de obra, o mercado corporativo paulistano se fecha à oferta de serviços terceirizados realizados à distância. Uma saída interessante seria através do estabelecimento de parcerias. As empresas de fora tem custos menores, e podem trabalhar com empresas de São Paulo oferecendo um serviço complementar ao que elas realizam. Aos poucos, esse processo pode ir validando o modelo de ter fornecedores externos. Outras idéias passam pela divulgação coletiva - grupos de empresas de uma cidade, divulgando seus serviços coletivamente, terão uma maior chance de penetrar no mercado fechado de São Paulo.

Quais são as armadilhas? Há muitas armadilhas no processo. Uma delas é que o cliente aceita um serviço realizado à distância, gosta do serviço, e pressiona para que o seu fornecedor o atenda a partir de uma base em São Paulo. Geralmente não há motivos técnicos para isso - são razões políticas, ou o simples conforto psicológico de saber que o fornecedor está ali do lado, mesmo que isso não faça a menor diferença. É importante saber lidar com esse tipo de situação, que no final traz resultados ruins para todos. Os custos aumentam, a qualidade de vida cai, e o crescimento do país continua concentrado.

Uma outra armadilha é simplesmente a questão da vaidade política. Acredito que em pelo menos um caso isso foi determinante: a transferência da área de TI da Oi de Belo Horizonte para o Rio de Janeiro. Na minha visão (estritamente técnica) não há motivos pelos quais uma empresa do porte da Oi não possa manter sua área de TI operando fora do Rio de Janeiro. A diretoria pode ficar lá, sem problemas; com uma estrutura de gestão profissional e ferramentas adequadas, é possívl gerir uma operação de TI em qualquer lugar do mundo. Ao levar a operação toda para o Rio, a Oi causa um grande impacto no mercado de Belo Horizonte; porém, para si própria, cria uma situação de aumento de custos. Estando em uma outra cidade, ela poderia ter uma mão de obra mais barata e mais ligada à empresa; estando em uma cidade como o Rio de Janeiro, passa disputar as melhores pessoas com dezenas de outras empresas, todas pagando "peso de ouro".

Essa é uma opinião que com certeza, gera controvérsia. Sinto que se pudermos trabalhar essa questão, vai ser possível melhorar a competitividade do Brasil no cenário mundial. Vamos levar desenvolvimento a vários lugares do Brasil, melhorar a qualidade de vida, e manter os custos baixos. Todos ganharemos com isso.

7 de agosto de 2007

Mais que grana

Vi uma frase fantástica, daquelas que eu gostaria de ter escrito, sobre a Internet e o bem público:

"But I don't want to live in a world where the only thing the Internet is useful for, or effective at, or pleasant or fun, are activities where someone is making money from me."

Não dá pra não assinar embaixo. Mesmo vivendo de comunicação de dados, e dependendo do "business" da Internet como ganha-pão, a verdade mais pura é simples - a Internet é mais do que um negócio. É mais do que um shopping. É mais do que comércio. Só começamos a arranhar o potencial da Internet como ferramenta para o bem público. Quem sabe iniciativas como inclusão digital conseguirão ampliar o seu potencial, transformando o mundo em um lugar melhor para viver.

4 de agosto de 2007

Ninguém lembra da infraestrutura

Primeiro foi o apagão. Depois, as estradas. Agora, o caos aéreo. Nos últimos anos, a gente se acostumou no Brasil ao noticiário de crise após crise. Tudo por falta de cuidado com a infraestrutura. O governo nunca sabe bem porque. A gente (que paga impostos) também paga a conta.

Essa semana, ruiu uma ponte nos EUA. Fatalidade? Não, o problema é pior. A infraestrutura dos EUA está esfarelando. O país mais rico do mundo tem problemas por todo lado: estradas ruins, aeroportos com a capacidade estourada, falta de água potável, estouro na geração e distribuição de energia elétrica.

O que é que há de errado? No Brasil dá para dizer que falta dinheiro. Mas o que justifica que o mesmo problema esteja ocorrendo - mais lentamente, mas em escala muito maior - no país mais rico do mundo?

Acho que o problema se explica justamente no nome. Infra. É o que está por baixo, o que ninguém vê. A gente só percebe o quanto precisa dela quando falha. É mais ou menos como se estourar, comendo carne vermelha e gordura saturada a vida inteira, e se surpreender quando o coração avisa que não dá mais. O que ninguém vê vai ficando em segundo plano.

No caso da saúde, com todas as dificuldades, o problema se resolve com a conscientização individual. Afinal, a saúde é sua, o problema é seu, você resolve. E mesmo assim pouca gente se mexe. Mas como resolver o problema coletivo? Como convencer as pessoas que o problema também é de cada uma delas? Essa é uma pergunta que na minha opinião, está longe de ser respondida.

26 de julho de 2007

Assimetria de interesses

Se você quer ser lido, escreva bem e escreva pouco. Se você quiser que o trabalho da sua equipe seja realmente produtivo, escreva bem e escreva pouco. Invista seu tempo escrevendo. A economia vale a pena.

Existe uma assimetria de interesses entre o autor e o leitor. O autor investe tempo na criação de conteúdo, enquanto o leitor investe tempo para consumir o conteúdo. Se cada um pensar apenas em si, o tempo do outro não interessa.

De que lado a corda arrebenta? Antigamente - quando o conteúdo era escasso, caro e difícil de encontrar - a corda arrebentava do lado do leitor. A gente comprava o livro que tinha para comprar ou ficava sem saber. Porém, a possibilidade de pesquisar (viva Google!) mudou a equação. É cada vez mais fácil achar o que se quer. Cabe agora ao autor respeitar o tempo do cliente.

O YouTube mostra bem o que está acontecendo. Basta ver a duração média dos clipes disponíveis - coisa de três, quatro, cinco minutos. Nos blogs bem sucedidos, existe uma tendência de escrever "posts" no estilo "short message". Um parágrafo, conteúdo concentrado. Redigir bem, e redigir textos curtos, é responsabilidade do autor.

No trabalho, eu passo por chato, porque insisto que resumir as informações é responsabilidade de quem envia, e não de quem lê. Se você recebe um documento de 100 páginas e dá forward para dez pessoas, está desperdiçando o tempo de todas elas. Se você já leu, pode escrever um resumo - o tempo que vai gastar para fazer isso é com certeza muito inferior ao tempo total que as dez pessoas gastarão para ler. E é tudo tempo da empresa, no fim das contas.

(Agora, se você não leu o documento de 100 páginas, para que está encaminhando para outras pessoas?)

9 de julho de 2007

Will The Real Open Source CRM Please Stand Up? | Open Source Initiative

I have posted a comment on the VTiger x SugarCRM, on a very interesting discussion asking "if there's a true open source CRM" in the market. Worth reading (the article, not necessarily my post).

6 de julho de 2007

Desenhando soluções viáveis

Soluções criativas são sempre interessantes. Assistindo a uma palestra do TED sobre a evolução do design baseado nas necessidades humanas, ouvi falar pela primeira vez sobre o projeto KickStart.

A KickStart é uma ONG que se especializou em criar ferramentas para combater a pobreza. O raciocício é simples: se existem empreendedores nos países ricos, também devem existir nos países pobres; o que lhes falta é a oportunidade de exercer o seu espírito empreendedor. Um dos problemas é que as ferramentas que usamos no ocidente não são adequadas para esses pequenos empreendedores; elas custam caro, são complicadas e difíceis de manter, e na maioria dos casos não refletem a realidade de um país africano. Assim, a KickStart oferece algo parecido com "kits", de tecnologia simples, desenhados para resolver problemas específicos ligados à realidade da região assistida. Existem kits para prensar óleo de girassol, para bombeamento de água para irrigação, e para construção civil.

Usando um modelo de negócios baseado em soluções simples e baratas, a KickStart já conseguiu alavancar mais de 50.000 novos pequenos empreendimentos em países pobres como Tanzânia e Quênia. Os negócios gerados por essas empresas representam um percentual ainda pequeno, mas mensurável do PIB desses países.

Pergunta: Se esses números são possíveis em países que estão efetivamente muito mais atrasados do que o Brasil, o que seria possível fazer por aqui?

5 de julho de 2007

Olha-olha-olha a água mineral

"Olha olha olha a água mineral
Especial
Você vai ficar legal
!"

Uns dez anos atrás, li uma matéria que projetava o crescimento do consumo de água engarrafada como uma das grandes tendências de mercado. Na época, pensei, "mas porque a gente iria pagar por água se temos água filtrada de boa qualidade em casa"? Pois é. Dez anos se foram, e hoje, o mercado de água mineral é um dos mais cresce no mundo todo.

A lógica do mercado de água mineral é um tanto quanto discutível. Pagamos por um produto que custa quase nada na torneira. A qualidade não é tão diferente assim, pelo menos aqui em Uberlândia ou em Belo Horizonte - não posso dizer em outras cidades do Brasil. Para cada garrafinha de água chegar ao consumo, consumimos energia elétrica para engarrafar e refrigerar; combustível, para distribuir; e ainda poluimos o ambiente com milhões de garrafinhas.

O irônico nisso tudo é que eu sou pessoalmente um aficcionado por água com gás. Esse ano, na minha viagem de férias de janeiro, fiz questão de ir na fonte da água mineral em São Lourenço, só para beber água com gás direto na fonte (isso mesmo, já sai da fonte com as bolhinhas). Depois fui em Cambuquira, onde a água é ainda melhor, apesar do abandono da fonte. O que atrai nesses lugares, tanto quanto a pureza e o sabor da água, é a história por trás dela - coisa que a água engarrafada muitas vezes apenas "encena", criando marcas e nomes míticos para fontes que não tem o mesmo charme.

Os argumentos pró e contra a água engarrafada são muitos. Uns dizem que é indefensável pagar um real por algo que a natureza dá praticamente de graça, cujo custo vem quase que exclusivamente do processo de distribuição e marketing. Já outros argumentam que é uma substituição simples - se você tomasse uma Coca-cola, iria poluir o ambiente tanto quanto ou mais, e ainda iria fazer mal para a saúde. Optar pela água não representa custo adicional. Sei lá. É algo que de alguma forma incomoda, e que precisa ser melhor pensado.

p.s. Só depois de ter escrito esse post, fiquei sabendo de um protesto na Internet contra a Nestlé pela exploração predatória do parque das águas de São Lourenço. Mais lenha para por na fogueira.

Atendente também é gente

Algumas idéias de marketing conseguem fugir totalmente do comum. Uma cadeia de fast food nos EUA bolou uma campanha muito legal: jogue uma mão de "papel, pedra e tesoura" com o caixa, e se você ganhar, tem um dólar de desconto.

O legal nem é o desconto. O legal é que você joga com o atendente, que geralmente é visto apenas como um robô, numa relação totalmente impessoal. De repente, um simples jogo torna a relação muito mais humana.

Levando a idéia adiante, o que podemos fazer, nas nossas empresas, para quebrar o gelo da mesma forma? Não é fácil imaginar algo tão eficaz como o jogo acima. Uma brincadeira mal pensada pode até depor contra a imagem da empresa. Mas vale a pena pensar nisso.

2 de julho de 2007

A bolha e a utopia tecnológica

Poucas coisas caracterizam tão bem a vaidade e a ambição humana como a utopia tecnológica, o desejo de resolver todos os problemas através da tecnologia. A (melhor) ficção científica está cheia de exemplos de idéias tecnológicas maravilhosas (como a produção de tecidos humanos em laboratório) que dão errado (vide "Blade Runner").

A ficção científica clássica é idealista. Porém, vivemos agora em tempos egoístas. A revista Forbes elaborou uma lista de quinze coisas que você gostaria que alguém inventasse. Entre útil, o curioso e o ridículo, alguém sugeriu... uma bolha para que a pessoa possa viver dentro, sem contato com o ruído e a sujeira do ambiente externo. Não consigo imaginar idéia mais ridícula, mas o pior é perceber que tem gente influente (foi entrevistado pela Forbes!) que realmente quer viver desse jeito. Assim a humanidade vai longe...

14 de junho de 2007

Menos!

Vivemos no mundo do "mais". Maior, mais rápido, mais eficiente, mais conectado. Vivo nesse tempo, e admito, sou viciado em trabalho. Fico até altas horas na frente do micro, lendo, estudando. Já liguei para meus colegas de trabalho as 11 da noite, pra saber se terminaram alguma coisa, ou como está a agenda de amanhã. Porém, agora, sinto que preciso reduzir esse ritmo.

Sinto falta do mundo do menos. Fazer menos coisas, mais devagar. Poder pensar melhor. Ter tempo para discutir com os amigos. Aliás - ter tempo de fazer amigos. Coisas que o ritmo alucinante da sociedade atual não permite. A sociedade quer "mais". O segredo do "menos" é saber viver com essa cobrança sem se deixar levar por ela.

Admito uma ponta de inveja das pessoas que conseguem viver no mundo do "mais" sem esforço aparente. Não estou falando daqueles workaholics famosos, que dormem 4 horas por noite, plugados em BlackBerry e tocando mil projetos ao mesmo tempo. Em geral, são pessoas que se tornam insuportáveis de conviver, pois não se conformam que as pessoas à sua volta não lhes sigam o ritmo obsessivo. Não se conformam que os outros possam ter metas menores do que aquelas que eles mesmos se impõem. Estou falando de gente que faz vários projetos sim, e contribui de forma significativa para a sociedade, mas que não faz nenhum alarde da produtividade insana. Gente que se dá o direito de tirar férias, de visitar amigos, de dormir até mais tarde. Será que elas, na verdade, dominaram o segredo do "menos"?

11 de junho de 2007

F1, segurança e... YouTube

Sempre gostei de F1, assisto desde novinho. (Lá vai tempo). Um dos "prazeres proibidos" de assistir corridas é a chance de ver um acidente espetacular; é o tipo da coisa que dá uma curiosidade danada, mas que ninguém em são consciência jamais desejaria para qualquer pessoa.

Já vi vários acidentes na F1, sempre pela TV (nunca fui numa corrida apesar de sempre pensar nisso). Assisti, entre outros, o acidente que matou Ronnie Peterson nos anos 70, o acidente que matou Gilles Villeneuve, e o acidente que matou Ayrton Senna. Mas também vi o acidente do Burti em Spa, a capotada sensacional do Gugelmin em Paul Ricard, sem contar as dezenas (literalmente) de acidentes do Andrea De Cesaris. E fazia tempo que não se via um acidente grande "de verdade" na F1, até ontem. No GP do Canadá, aconteceu um acidente horroroso com o Robert Kubica, uma das boas promessas da nova geração de pilotos. O comentário do Niki Lauda foi sintomático - "no meu tempo uma batida dessa dava para matar o piloto duas vezes". Ou mais.

Agora, sabendo que tudo está bem com o polonês, começa a investigação das causas e de como um acidente dessa magnitude pode ser minimizado. A imagem oficial da TV não é boa, mas uma câmera localizada na arquibancada próxima "grampo" pegou uma imagem fantástica. Obviamente foi postado no YouTube. Selecionei algumas imagens, dá para analisar a trajetória do carro:





A batida foi do pior tipo possível, o carro "decolou" quando transitou da pista para a grama na área de escape. A câmera oficial dá a impressão que o carro "chapa" de frente no muro, o que obviamente não é verdade. Nota-se que o carro bate num ângulo de mais ou menos 45 graus, o que permite que um pouco da energia seja dissipada. Note que o carro também "trisca" o muro atrás do qual havia outro carro, mas felizmente não toca nele.

O mais impressionante é o resultado final. Um tornozelo quebrado e um baita susto. Palmas para a segurança dos carros modernos, mas também, palmas para o YouTube, que nos permite ver essas imagens exclusivas... sem ficar dependendo das redes de TV.

Blogando

Normalmente eu reservo o "blog principal" para idéias mais trabalhadas, e usava outros blogs para postar sobre outros assuntos. Acho que fazia isso por medo de perder a "identidade" do blog. No entanto, o que isso causa? Medo de postar qualquer coisa, e o blog vai ficando para trás.

Por isso, não se assustem se encontrarem posts mais aleatórios do que nunca no blog a partir de agora. Fica sendo meu blog e pronto.

12 de abril de 2007

Subculturas

A Internet é cada vez mais um lugar diversificado. Este fenômeno se comprova a cada dia. A população original da Internet era predominantemente ligada ao meio acadêmico, e se comunicava em inglês. Quem não soubesse inglês, ficava de fora, ou era ativamente discriminado. Hoje o inglês ainda é considerado a lingua franca da Internet; porém, em termos absolutos, a situação se inverteu e a maioria dos usuários que só se comunica no seu próprio idioma. Quem só navega páginas em inglês pode estar perdendo tendências importantes.

O interessante é ver como esse fenômeno foi largamente ignorado. Nos anos 90, a elite da Internet temia que esta acabasse, vítima da fragmentação causada pelos provedores de conteúdo. Diga-se de passagem, sempre achei que as pessoas dão importância demais para os provedores de conteúdo. Mas lembrando Andy Warhol, a era dos 15 minutos de fama chegou. Blogs e YouTube são ferramentas para que cada um se faça ouvir. Em 2006, o "homem do ano" da revista Time foi... você. You. E no final das contas, quem está fragmentando a Internet não são as empresas, e muito menos os governos (que vem tentando exercer seu controle com cada vez mais força). São as pessoas.

Como toda transformação, a mudança da Internet "english only" para uma Internet realmente globalizada é lenta mas irresistível. O fenômeno só não é mais visível hoje devido à dificuldade que as empresas vem encontrando de capitalizar o potencial das comunidades. Cada comunidade representa uma subcultura, que se organiza de forma mais ou menos autônoma em torno de algum interesse comum. É a subcultura do Orkut (grande suficiente para ser vista da Lua), a subcultura do Kazaa, ou a subcultura dos oekakis (já havia ouvido falar disso?).

Falando o óbvio, a grande oportunidade está nas ferramentas que permitem que as pessoas consigam encontrar as coisas que realmente lhe interessam. Hoje é óbvio, mas não era em 1999, quando o Google foi fundado. Na época a grande onda eram os portais (olha aí a obsessão pelo provedor de conteúdo manifestada ao máximo). O principal motivo pelos quais os portais falharam foi a sua incapacidade de se adequar às reais necessidades das pessoais, de entender as subculturas da Internet.

No fundo, não estamos vendo nada de novo. Há quem ache que a massificação é um fenômeno recente; no entanto, a história mostra que ela é um fenômeno social cíclico. A massificação não escala tão bem como muita gente imagina. Todos os grandes movimentos sociais da história foram seguidos de fragmentação. Por isso, achar que as ferramentas de comunicação em massa permitiriam uniformizar o consumo ad infinitum é um grande engano. Dentro de uma massa uniforme, as pequenas diferenças logo se destacam, atingem massa crítica, e levam ao surgimento de subgrupos e subculturas. Com o tempo a diferença se torna tão grande a ponto de se tornar incontrolável. A Internet é apenas mais um meio para que essa propriedade intrínseca dos grupos sociais se manifeste. Por isso, sejamos todos bem vindos à nossa, à sua, à nova Internet.

12 de março de 2007

A irresistível sede de comunicação

O que nos faz humanos? O que nos faz diferentes de tantas outras formas de vida? Uns dizem que é a consciência. Outros dizem que é a presença da alma. Outros dizem que é a linguagem. Qualquer que seja a resposta, o fato é que o ser humano tem uma sede irresistível por comunicação, com o mundo e com seus semelhantes. Nesse contexto, a Internet é apenas mais um meio de comunicação, em uma lista que se estende desde os primeiros rituais pré-históricos, passando pela invenção da palavra falada, até o mundo moderno. Somos ainda os mesmos animais tribais. Temos sede de nos relacionar.

O curioso é que esta sede, de tão onipresente, passa muitas vezes despercebida. Empresários, engenheiros e marqueteiros investem incontáveis horas criando novos modelos de negócio em telecomunicações. Muitos desses modelos se centram em outras necessidades do ser humano. O desejo de status; a busca do entretenimento, da diversão; a necessidade de informação. Porém, nessa busca, a necessidade primária do ser humano é muitas vezes relegada a segundo plano.

Acho curioso ver empresas de telecomunicações e tecnologia investindo milhões para desenvolver novos negócios, envolvendo mídia digital, quando o próprio negócio de comunicação inter-pessoal ainda poderia render muitos dividendos. Acho que é um pouco como aquela história do patrício que perdeu as chaves no meio da rua e estava procurando debaixo do poste, porque lá tinha mais luz. Pensar no negócio de conteúdo é tentador porque envolve glamour, envolve status, e também porque é aparentemente mais simples, porque toda comunicação é unilateral. A indústria de Hollywood é a luz embaixo do poste.

Pensar no negócio da comunicação inter-pessoal é mais complicado, e também mais arriscado. Não há como controlar o conteúdo envolvido. A mesma rede que usamos para conversar com nossos parentes distantes sustenta a Al Qaeda. Porém, a sede de comunicação do ser humano é inextinguível.

Fica portanto uma idéia para as operadoras de telecomunicações: esqueçam o conteúdo. Pensem nos seus usuários. Pensem no que eles precisam para se comunicar. Tornem a experiência agradável. Tornem os sistemas convenientes de usar. Facilitem a vida das pessoas. Deixem que elas encontrem-se umas às outras. Permita a elas que multipliquem sua rede de relacionamento. Elas vão se comunicar, como tem feito desde que o homem veio ao mundo. O efeito de rede será avassalador.