1 de setembro de 2004

O futuro é Wireless LAN

Aplicar a futurologia à previsão de mercado de tecnologia é uma tarefa mais difícil do que parece. A evolução do mercado muitas vezes não parece seguir uma lógica evidente. Não é só uma questão de marketing -- como querem alguns -- ou de méritos técnicos, como acreditam outros. Nem sempre a tecnologia suportada pelos principais players do mercado vence. Nem sempre a melhor tecnologia vence. Nem sempre o primeiro a chegar leva alguma vantagem. Mas há uma lógica, talvez um tanto obscura e longe de ser óbvia, que ajuda a explicar como estas coisas acontecem.

A evolução da tecnologia de Wireless LAN segue, por enquanto, o mesmo caminho difícil e complicado seguido por outras tecnologias. Um exemplo claro é o TCP/IP. Inicialmente o patinho feito das tecnologias de rede, o TCP/IP acabou sendo adotado pela Internet quase por acidente, como uma solução intermediária para resolver os problemas de escalabilidade do NTP (que já era uma evolução do protocolo original da Arpanet), enquanto não se resolviam as questões finais de um projeto muito maior e mais ambicioso: o modelo ISO de redes.

Todo mundo que estudou redes nos anos 80 e 90 conhece o modelo de sete camadas da ISO. O que pouca gente sabe é que o TCP/IP, apesar de estruturado em camadas, não segue o modelo ISO. O modelo TCP/IP é mais simples, e faz uma série de compromissos bastante pragmáticos. Além disso, o modelo ISO era sustentado por uma aliança global de fabricantes de hardware e software, e contava com o apoio das entidades de normatização nacionais de vários países filiados à ISO (caso do Brasil, por exemplo). Porém, mesmo assim, o modelo ISO nunca decolou, e o TCP/IP se firmou. Porquê?

A introdução de novas tecnologias segue um padrão no tempo todo especial. Conceitos como early adopters e massa crítica são adotados para explicar o ritmo de adoção de uma determinada tecnologia. No caso específico das tecnologias de telecomunicação, o efeito multiplicador da base instalada se faz sentir de forma ainda mais acentuada. É este o fator primordial -- o fato de que qualquer pessoa que queira se comunicar com a rede existente precisa de um equipamento compatível. Não há nada mais importante do que isso.

No caso das wireless LANs, o que se vê é uma repetição do mesmo fenômeno. O protocolo 802.11b -- base dos investimentos iniciais em WLAN -- é reconhecidamente limitado em vários aspectos. Porém, o volume de instalações continua crescendo, e os sucessores do 802.11b já começam a fazer estragos em outras opções mais bem nascidas, como é o caso do Bluetooth.

O que leva o 802.11b, com todas suas limitações, a ocupar um espaço tão proeminente no mercado? Primeiramente, ele é uma solução para problemas que já existem. Ele pode ser usado de forma transparente para redes locais ou para links privativos de alta velocidade em distâncias respeitáveis. Segundo, a tecnologia funciona. E finalmente, o custo é imbatível.

O mercado oficial vem tentando entender o motivo deste sucesso, mas segue uma abordagem equivocada. O uso do 802.11b não ocorre apenas por causa do preço, como supõem alguns. O principal charme da tecnologia é resolver problemas que existem de forma prática, e porque não, barata. Por outro lado, o mercado de telecomunicações, de forma geral, vive uma situação totalmente diversa -- a necessidade de estimular demanda de massa por produtos que ainda não existem, para um mercado que ainda não está pronto.

Se aplicarmos a análise convencional às Wireless LANs, vemos uma situação paradoxal. As pessoas não procuram ainda pela mobilidade, banda larga, privacidade, e garantia de serviço -- ao menos, não estão conscientes destas necessidades, ou até mesmo acreditam que ainda estão longe deste ponto. O que elas querem é resolver um problema. A solução do problema imediato pode até trazer outros problemas -- mas estes serão resolvidos um de cada vez. Esta mentalidade pragmática já transformou o TCP/IP, com todas suas limitações, em uma infraestrutura global de transporte. A tecnologia de Wireless LANs segue pelo mesmo caminho. Ainda é cedo para dizer quantas melhorias serão necessárias no futuro, mas nada pode derrotar uma solução simples que funciona.

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