31 de agosto de 2007

O problema da concentração de TI em SP (e RJ)

Tem um tema que me incomoda faz tempo, que é a excessiva centralização do Brasil em torno de São Paulo, e em menor escala, do Rio de Janeiro. Para quem trabalha no setor de tecnologia, essa concentração é preocupante. É ruim para todo mundo:

  • as empresas localizadas em São Paulo reclamam dos custos altos e da carência de mão de obra;
  • os profissionais de tecnologia reclamam que não há opção fora de São Paulo. Alguns vão e entopem ainda mais a cidade, e mesmo assim, não conseguem suprir toda demanda. Outros ficam e não conseguem se desenvolver, por falta de opção profissional.
  • as empresas que ficam fora de São Paulo tem seu crescimento limitado, pois o mercado é restrito.
O curioso nisso tudo é que o mercado global vive uma fase de crescimento acelerado. Há grandes oportunidades de 'outsourcing'. O Brasil tem uma posição forte nesse mercado e poderia crescer ainda mais, porém, para isso precisa equacionar melhor uma série de coisas. Acredito que a questão da concentração em São Paulo é uma delas. Vejamos alguns pontos:
  • Existem várias cidades no Brasil com índices de educação e qualidade de vida que podem sediar empresas fortes no segmento de TI, como é o caso de Belo Horizonte, Curitiba, Porto Alegre, Salvador e Recife.
  • A infra-estrutura de telecomunicações já possui capacidade suficiente para suportar aplicações de colaboração, incluindo videoconferência e outras tecnologias de comunicação e cooperação em tempo real.
  • Atividades importantes, como hospedagem de datacenters, desenvolvimento de software e suporte podem ser feitas remotamente, usando os meios de comunicação citados.
Tenho a percepção de que em outros países, a concentração tende a ser menor do que no Brasil. Nos EUA, existem muitas empresas de software e TI sediadas na Califórnia, mas estão espalhadas por uma área relativamente grande se comparado com a cidade de São Paulo; isso tem impacto na qualidade de vida. Além disso, grandes empresas ficam fora dessa área, como é o caso da Microsoft, que fica no Estado de Washington, bem mais ao norte; e boa parte da pesquisa é feita na costa leste, em Massachussets. Outros segmentos são ainda menos concentrados - a indústria de chips tem presença forte no meio-oeste, e a indústria de telecomunicações tem presença na região de Boston e na Flórida.

A concentração traz um grande problema porque perpetua uma situação ruim. As pessoas vão para São Paulo porque só tem emprego lá; o mercado das outras regiões não se desenvolve; e a qualidade de vida em São Paulo só faz cair. A cidade está a ponto de um colapso urbano. A única forma de crescer, agora, é descentralizando, descarregando as operações em outros locais, de forma a criar um crescimento sustentado com uma base muito maior.

Porque as coisas no Brasil são assim? Um dos motivos é que nós gostamos de fazer negócio "olho no olho". Outro motivo é que nossa infraestrutura de transporte é historicamente deficiente, e as pessoas preferem não ter que viajar muito - perde-se muito tempo, custa caro, não é seguro, etc. Porém, se quisermos aproveitar o crescimento do mercado mundial, é importante que sejamos capazes de superar essa barreira.

Como superar esse problema? Essa é a parte mais complicada. As empresas de fora de São Paulo não conseguem ainda penetrar no mercado de lá. Apesar de reclamar da falta de mão de obra, o mercado corporativo paulistano se fecha à oferta de serviços terceirizados realizados à distância. Uma saída interessante seria através do estabelecimento de parcerias. As empresas de fora tem custos menores, e podem trabalhar com empresas de São Paulo oferecendo um serviço complementar ao que elas realizam. Aos poucos, esse processo pode ir validando o modelo de ter fornecedores externos. Outras idéias passam pela divulgação coletiva - grupos de empresas de uma cidade, divulgando seus serviços coletivamente, terão uma maior chance de penetrar no mercado fechado de São Paulo.

Quais são as armadilhas? Há muitas armadilhas no processo. Uma delas é que o cliente aceita um serviço realizado à distância, gosta do serviço, e pressiona para que o seu fornecedor o atenda a partir de uma base em São Paulo. Geralmente não há motivos técnicos para isso - são razões políticas, ou o simples conforto psicológico de saber que o fornecedor está ali do lado, mesmo que isso não faça a menor diferença. É importante saber lidar com esse tipo de situação, que no final traz resultados ruins para todos. Os custos aumentam, a qualidade de vida cai, e o crescimento do país continua concentrado.

Uma outra armadilha é simplesmente a questão da vaidade política. Acredito que em pelo menos um caso isso foi determinante: a transferência da área de TI da Oi de Belo Horizonte para o Rio de Janeiro. Na minha visão (estritamente técnica) não há motivos pelos quais uma empresa do porte da Oi não possa manter sua área de TI operando fora do Rio de Janeiro. A diretoria pode ficar lá, sem problemas; com uma estrutura de gestão profissional e ferramentas adequadas, é possívl gerir uma operação de TI em qualquer lugar do mundo. Ao levar a operação toda para o Rio, a Oi causa um grande impacto no mercado de Belo Horizonte; porém, para si própria, cria uma situação de aumento de custos. Estando em uma outra cidade, ela poderia ter uma mão de obra mais barata e mais ligada à empresa; estando em uma cidade como o Rio de Janeiro, passa disputar as melhores pessoas com dezenas de outras empresas, todas pagando "peso de ouro".

Essa é uma opinião que com certeza, gera controvérsia. Sinto que se pudermos trabalhar essa questão, vai ser possível melhorar a competitividade do Brasil no cenário mundial. Vamos levar desenvolvimento a vários lugares do Brasil, melhorar a qualidade de vida, e manter os custos baixos. Todos ganharemos com isso.

7 de agosto de 2007

Mais que grana

Vi uma frase fantástica, daquelas que eu gostaria de ter escrito, sobre a Internet e o bem público:

"But I don't want to live in a world where the only thing the Internet is useful for, or effective at, or pleasant or fun, are activities where someone is making money from me."

Não dá pra não assinar embaixo. Mesmo vivendo de comunicação de dados, e dependendo do "business" da Internet como ganha-pão, a verdade mais pura é simples - a Internet é mais do que um negócio. É mais do que um shopping. É mais do que comércio. Só começamos a arranhar o potencial da Internet como ferramenta para o bem público. Quem sabe iniciativas como inclusão digital conseguirão ampliar o seu potencial, transformando o mundo em um lugar melhor para viver.

4 de agosto de 2007

Ninguém lembra da infraestrutura

Primeiro foi o apagão. Depois, as estradas. Agora, o caos aéreo. Nos últimos anos, a gente se acostumou no Brasil ao noticiário de crise após crise. Tudo por falta de cuidado com a infraestrutura. O governo nunca sabe bem porque. A gente (que paga impostos) também paga a conta.

Essa semana, ruiu uma ponte nos EUA. Fatalidade? Não, o problema é pior. A infraestrutura dos EUA está esfarelando. O país mais rico do mundo tem problemas por todo lado: estradas ruins, aeroportos com a capacidade estourada, falta de água potável, estouro na geração e distribuição de energia elétrica.

O que é que há de errado? No Brasil dá para dizer que falta dinheiro. Mas o que justifica que o mesmo problema esteja ocorrendo - mais lentamente, mas em escala muito maior - no país mais rico do mundo?

Acho que o problema se explica justamente no nome. Infra. É o que está por baixo, o que ninguém vê. A gente só percebe o quanto precisa dela quando falha. É mais ou menos como se estourar, comendo carne vermelha e gordura saturada a vida inteira, e se surpreender quando o coração avisa que não dá mais. O que ninguém vê vai ficando em segundo plano.

No caso da saúde, com todas as dificuldades, o problema se resolve com a conscientização individual. Afinal, a saúde é sua, o problema é seu, você resolve. E mesmo assim pouca gente se mexe. Mas como resolver o problema coletivo? Como convencer as pessoas que o problema também é de cada uma delas? Essa é uma pergunta que na minha opinião, está longe de ser respondida.